PRETENSÃO

Ampliar os horizontes da inclusão é a pretensão deste blog. E inclusão não apenas entendida como movimento de pessoas com deficiência, senão também abordar a ecologia, os movimentos de luta por direitos e cidadania, etc. Falar de inclusão, portanto, significa acolher o meio e todas as pessoas. Significa também respeitar e tolerar a singularidade, fazendo da compreensão uma forma de convivência pacífica e plural. Na inclusão ninguém pode ficar de fora!

quarta-feira, 15 de março de 2017

O AMOR E A DOR





“Quem não receber como criança o Reino de Deus, nunca entrará nele” Mc 10, 15


Foi pensando nestas palavras ditas por Jesus, que peguei a estrada de volta para casa, após uns dias fora, colaborando com um parente na agitada tarefa de adiantar as encomendas da pequena firma, que aumentam no final do ano. Entre tantos afazeres, um tempinho dedicado na atenção, cuidados e brincadeiras ao pequeno garoto da casa.

Precisando de uma pausa para retomar a rotina, na hora da despedida, num abraço gostoso, eis que o menino grudou-me ao pescoço e pediu com insistência que não fosse embora. Devolvendo aquele abraço com ternura, expliquei-lhe a necessidade e reafirmei que voltaria na semana seguinte, dada a urgência das tarefas. Mas não consegui convencê-lo. Aliás, criança pequena não conhece o tempo, o amanhã... Ela vive apenas o hoje!

Quando viu que não tinha jeito, desatou então a chorar. Próprio de quem vê que os argumentos não convenceram, ficando sem munição. Aquilo foi de cortar o coração!

Sugeri então que viesse comigo, que fizéssemos sua malinha para que dormisse em casa, e depois voltaríamos juntos. Ele olhou então para a mãe e mais lágrimas rolaram, por ser tão pequeno e não conseguir ficar longe dela.

O choro, esta sensação tão misteriosa que, enquanto extravasa a tristeza e a dor, alivia e nutre o amor...

Aquela cena tão comovente, tão simples e pura obrigou-me a segurar o choro. Não porque ele estava chorando, mas porque a dor do conflito machucava-o a ponto de ter que decidir entre o querer e o não poder. Quão difícil para uma criança aprender ainda pequena os caminhos do amor em paralelo com a dor!

Amor e dor caminham de mãos dadas! Como explicar isso aos pequenos? Eles que tem a consciência da carência, de necessidade do outro, a sensação de que a solidão não é coisa boa. Então, num momento de abandono sua única alternativa é o choro, como forma de desafogar o medo de ficar só, pois ninguém nasceu para ficar sozinho...


Quando fez a Criação, Deus disse: “Não é bom que o homem fique só!” Gn 2,18

E me perguntei aquele dia inteiro... O amor dói, por quê?

Criança gosta de gente, de contato, de brincar, de natureza, de bichos e de tudo que é novidade. Criança vê com pureza tudo que se apresenta à sua frente. Deslumbra-se com a criação e seu mundinho é constantemente povoado de fantasias. Criança amada aprende a amar; acolhida, aprende a respeitar. Vive perguntando “por que” porque sabe que não sabe. E não tem vergonha de perguntar... Sua bagagem cresce e se transforma com o aprendizado colhido através das perguntas que faz.

Nós adultos é que desaprendemos a ser criança. Não no sentido infantil, mas na candura, na simplicidade, na falta de ambição.

E, voltando àquela cena, na tentativa de consolar o garoto e fazê-lo entender que a minha volta não demoraria tanto, tive a ideia de deixar com ele meu relógio de pulso, numa forma palpável dele perceber a necessidade do objeto, o qual eu voltaria a buscá-lo. E o choro estancou.

Saber que é preciso ser criança mesmo sendo um adulto, ajuda-nos a ser mais humanos e humildes, recarrega a esperança na humanidade e ativa o ânimo em investir mais nas crianças hoje como as sementes do amanhã, de um futuro melhor, um mundo mais fraterno.
Utopia? Não creio.

E fico pensando também na brilhante “ideia” que Cristo teve de, para que não ficássemos sozinhos, Ele transformou-se em comida e deixou-nos a Eucaristia como forma de percebermos e sentirmos sua presença sempre conosco, aqui e agora! Sinal que Ele também viveu o amor e a dor...


“É preciso amor
Pra poder pulsar
É preciso paz pra poder sorrir
É preciso a chuva para florir”
(Almir Sater)


 (Texto editado em 2012. Hoje repostado cinco anos depois, com a mudança do menino para outro estado, deixando autora de coração partido e invertendo assim o texto, teimando desgrudar do pescoço dele).



Pela Inclusão e pela Vida.







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