Numa dessas manhãs frias, fazendo
companhia a meu pai na visita ao cardiologista, deparamo-nos com o consultório consideravelmente
lotado em relação às outras vezes, sinal de que as doenças cardíacas aumentam
no inverno, principalmente com idosos, pela postura retraída a que o corpo se
submete em relação aos nervos e músculos nos dias mais frios. Realmente, a
maioria ali era formada por idosos. Exceção era alguns poucos jovens naquele
meio, como as duas mães, cada qual com seus meninos pequenos, as únicas
crianças ali.
Uma delas, sentada sob um canto
meio escondido da sala, tinha um garoto que beirava os quatro ou talvez, cinco
anos. A outra, mais jovem, rodava a sala inteira atrás de seu bebê que mal
aprendera a andar e, inquieto, movimentava-se tropegamente por todos os cantos
do recinto, até descobrir outra criança como ele, de brinquedos na mão.
O menino maior, mostrando-se
tão amoroso com o pequeno, deixou que ele se divertisse também com um dos
brinquedinhos. O gurizinho, porém, depois de um tempo, enjoado da mesmice,
partiu para cima do outro, levando consigo todos seus brinquedos até o extremo
do canto oposto, deixando-o aos prantos.
Apaziguando a situação, a mãe
do bebê colocou-o para devolver, peça por peça a seu dono, pegou seu rebento no
colo e foi sentar-se na parte mais atrás da sala, donde não se podia avistar a
outra criança. Desta vez foi o pequeno que desatou a chorar, desvencilhando-se
a todo custo de seus braços, correndo para onde estavam os brinquedos e seu
dono. Foi a vez de a outra mãe dizer algo ao filho e colocar os dois
sentadinhos no chão, lado a lado, partilhando o brincar.
Naquela cena em que foi possível
perceber - em sequencia - a partilha das crianças e depois o rompimento, o
choro, a mágoa e finalmente, a conversa e o retorno ao brincar de um jeito novo,
fiquei refletindo toda a definição prática sobre o significado do perdão. Uma
linguagem tão simples, que as crianças vivem e dominam, mesmo sem entender,
porque elas sabem o que é o amor: a necessidade de ter alguém igual elas para
trocar, partilhar, viver. No brincar o tempo para, não existe nada ao redor
melhor do que aquele momento. É uma mágica que alegra, que transforma e
perdura, faz feliz. E pode acontecer de muitas maneiras, em muitos outros “brincar”.
“Perdoar
não é fazer de conta que eu não fui ofendido/a, não é negar que o outro me
feriu, porém, reconhecer que eu fui ferido/a, que a dor doeu profundamente, mas
assim mesmo eu tenho capacidade de perdoar. Uma ofensa realizada não pode ser
desfeita, mas o efeito que provocou na vítima pode ser eliminado através do
perdão. O não perdoar faz a pessoa querer se passar por vítima; foi ela que
sofreu, ela que foi humilhada, ela que ainda hoje sofre as consequências da
ofensa. Só o perdão é capaz de trazer de volta ao indivíduo o bem estar, a
alegria, a saúde e, sobretudo, o grande feito de fazer passar a dor, porque a
pessoa escolheu recusar-se a conservá-la e a trazer de volta ao seu coração a
paz.” Dra. Ely Barreto
(Postado em setembro/2016)
Pela Inclusão e pela Vida!
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