PRETENSÃO

Ampliar os horizontes da inclusão é a pretensão deste blog. E inclusão não apenas entendida como movimento de pessoas com deficiência, senão também abordar a ecologia, os movimentos de luta por direitos e cidadania, etc. Falar de inclusão, portanto, significa acolher o meio e todas as pessoas. Significa também respeitar e tolerar a singularidade, fazendo da compreensão uma forma de convivência pacífica e plural. Na inclusão ninguém pode ficar de fora!

sábado, 11 de novembro de 2017

Reminiscências da Redação Enem/17





“A tarefa não é tanto ver aquilo que ninguém viu, mas pensar o que ninguém ainda pensou sobre aquilo que todo mundo vê” (Arthur Schopenhauer)

Antigamente (quando criança) era costume a família fazer as compras do mês (ou da semana) num armazém de secos e molhados, onde se encontrava de tudo, desde gêneros alimentícios, roupas, louças e utensílios de cozinha e que se estendia também a cordas, ferramentas e materiais elétricos. Tudo num único estabelecimento apenas, que só havia na vila ou então no centro da cidade.

Hoje, temos os supermercados mais variados para escolher, seja por local, preços e sortimento de produtos, tão diferente de antigamente onde o quesito – opção do consumidor – é o que se leva em conta.

Usando dessa analogia, encontrei uma forma de falar sobre acontecimentos transcorridos por ocasião da prova de redação do ENEM 2017 no último domingo, nada ligado ao terreno do consumo, mas que diz respeito ao direito da pessoa poder escolher um modelo de educação que venha de encontro com seus anseios e necessidades e não onde ela tenha que se adaptar compulsoriamente.

Refiro-me ao estudante surdo carioca que prestou o referido exame e, surpreso com o tema da redação, aproveitou elaborar sua dissertação baseando-a na trajetória de exclusão a que foi submetido primeiramente na PUC/RJ e depois na UFRJ. Valendo-se do resultado do Enem/2016, ingressou no início deste ano na PUC/RJ no curso de Filosofia, sendo beneficiado com uma bolsa de estudos. Como é oralizado (faz leitura labial) e usuário de tradução simultânea (lê os lábios do tradutor em tempo real), não se adaptou às aulas com Intérprete de Sinais já que não domina a Libras. Como resultado, seu fraco aproveitamento pela falta de comunicação custou-lhe a bolsa e o trancamento do curso. Seis meses depois ingressou na UFRJ, classificando-se em primeiro lugar no curso de História, com a esperança de que ali, por ser pública, pudesse encontrar melhor acesso. Acabou não encontrando nenhum.

Bastou o tema da redação do exame atual apontar para “Desafios para a formação educacional de surdos no Brasil”, que começaram a pipocar casos de às quantas tem andado o quadro da exclusão na educação do país. A começar pela falta de conhecimento das diferenças entre surdez e deficiência auditiva; de que nem todo surdo usa Libras; como nem todo sinalizado tem domínio pleno da língua portuguesa e por aí vai...

Voltando lá no armazém, onde o feijão e o arroz disponíveis ficavam armazenados soltos em caixotes de madeira e eram vendidos a quilo e acondicionados em sacos de papel - sem validade nem origem e procedência, tão diferente dos cinco quilos que hoje compramos nos mercados e com centenas de marcas e procedências - há de convir que o tempo, os avanços e a tecnologia transformaram completamente o mercado, de modo que a variedade possibilitou às pessoas escolher de acordo com seus gostos e bolsos.

Do mesmo modo, não se pode simplificar a educação de surdos e/ou deficientes auditivos de forma simplista, onde basta apenas colocar um Intérprete de Libras numa sala de aula que tudo estará resolvido.

A surdez é diversa, assim como as formas variadas de comunicação entre os sujeitos. Logo, a pessoa não pode sofrer imposição a um único sistema oferecido, como aconteceu com o Bernardo acima. Ela tem o direito de escolher o que melhor vem de encontro a seus anseios para que possa desenvolver suas habilidades com liberdade e respeito, afinal vivemos num sistema democrático e com garantias na Constituição Federal.

Com todo respeito que dedico a quem se utiliza de comunicação em Libras, considero que se deve respeitar também quem não domina essa língua, como os oralizados e os implantados.

E como as mudanças não acontecem da noite para o dia, pensar os desafios educacionais para surdos ou deficientes auditivos é salutar a recomendação primordial para os pais e famílias diante de um quadro de surdez, de que se deve começar na primeira infância com profissionais habilitados, logo da detecção da surdez, para que se tenham informações e aconselhamentos quanto ao direcionamento às políticas de atenção à saúde e educação como medidas de reabilitação e inclusão, que abrangem a adaptação de aparelhos de amplificação sonora; fonoterapia; implante coclear (ouvido biônico) dentre outros.

Há de se ressaltar que especialistas em audição tem reafirmado que é constante a falta de informações na família, no momento da instalação do quadro de surdez, somadas à instabilidade emocional e psicológica dos pais, quanto ao acesso a esses serviços de reabilitação, que tem sido a causa pela qual muitos deles recorrem à Libras como se a única forma de comunicação disponível, quando esta deveria ser a última alternativa, esgotadas todas as tentativas por alternativas. Daí a disseminação dessa forma de comunicação como a mais utilizada.

Informação é tudo.



Pela Inclusão e pela Vida!






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