“Não
sei o nome dele ainda.... Mas sei que não para de andar. E onde quer que vá,
carrega consigo a inseparável lata pintada, envolta pela grossa camada de linha
branca já amarelada, não pelo cerol (nem pensar) mas do manuseio ininterrupto.
Não,
ele não tem a pipa! E nem pode tê-la, ao menos ali, por questões de segurança.
Então,
quando ele entrou naquela alegre fila para retirar o seu presente, pensei que,
pelo largo pacote recebido, talvez fosse o que imaginara.... Enganei-me!
E
chegada a hora de encerrar ali as atividades, ao passar pela alameda que
antecede o portão, vi-o sentado num dos bancos com a inseparável lata e também
com o presente ganho, como que pronto para sair, viajar. Às suas costas estava
a mochila nova e bem cheinha e ele, como que num estado de espera. Não sei se
esperava por alguém de fato, ou se era a constante fantasia que o acompanha.
Mas fiquei feliz de saber que uma mochila era sinal de que caberia uma muda de
roupas. E esta o acompanharia a algum lugar. E neste lugar alguém poderia
dedicar um tempo só para ele, soltando uma pipa apenas pelos ares, para que ele
sentisse o sabor do sonho, da realização com aquele simples presente.
∞ ∞ ∞
Esqueci-me
do nome deste outro, mas não esqueci seu rosto. Afinal, eles são tantos e só o
tempo se encarregará de ir apresentando um a um...
Um
rosto tão lindo e doce. Os cabelos espetados como que raspados à máquina. Já
crescidos, estavam macios para um bom cafuné. Aquele homem feito deve ter uma altura
que ultrapasse a minha, coisa que não dá para saber porque ele fica ora na
cama, ora na cadeira.
Quando
entrei no quarto para buscá-lo ele já estava pronto. Era só dar meia volta e
seguir o corredor até o elevador. Sim, um presente também o esperava. Tímido,
mostrou-se avesso a qualquer olhar, toque ou gesto, demonstrado através do
incontrolável impulso de morder as próprias mãos.
Naquele
longo corredor, nenhuma palavra! Nenhuma reação senão aquela em que
correspondeu com um sorriso a uma das cuidadoras que atendia em outro quarto.
Parei, voltei de ré e deixei aquela relação se intensificar mais um pouco,
mesmo que da porta apenas. Se ele ficara feliz, por que não prolongar aquele
prazer?
Ele
sorriu mais ainda para a senhora, que foi se aproximando até abraçá-lo com a
ternura de uma mãe. Ela chamou-o pelo nome e ele gargalhava. Não sabia e nem
podia abraçá-la. Que importaria, se era tão visível aquela comunicação
completa?
E
quando chegamos naquela alegre fila de presentes e seu nome foi anunciado,
nenhuma reação ele esboçou. Com dificuldade em uma das mãos, ajudei-o a abrir o
pequeno pacote e, num rápido movimento da outra mão, ele levou a colorida
caneca à boca com sofreguidão, como a satisfazer o desejo mais explícito:
morder.
∞ ∞ ∞
Presentes...
O que é um presente? Algo que se dá e recebe apenas? Algo que se troca? Agrado
ou desagrado?
Meus
olhos viram ali um significado envolvente.... Um presente que não existe, outro
que não agrada! E um gesto que se espera, se recebe.... Este sim faz feliz!
Não
é preciso ter razão, raciocínio. Nem intelecto ou esperteza, porque o AMOR é
algo que qualquer um pode trocar, entender e captar. E esse misterioso segredo
embutido, cuja linguagem é gostosa e completa emana do Amoroso, Bondoso e
Eterno Pai do Céu!” (Texto postado em
dezembro/2013)
HOJE, já sei o
nome deles, embora me confunda às vezes, por serem tantos. A distribuição de
presentes de Natal continua ativa e é a única ocasião do ano em que todos recebem
um agrado, embora muitos não entendam o que seja a ocasião.
Porém, que vale mesmo é o afeto,
a ternura e o carinho de abraços, sorrisos e toques trocados com pessoas que convivem
e se doam, os verdadeiros presentes que eles compreendem tão bem.
(Postagem de 2019, antes da pandemia, que nos privou de presenças e abraços)
Pela Inclusão e pela Vida!
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