Certa vez, no Juizado Especial, enquanto aguardava minha vez de ser atendida, busquei ocupar o tempo de espera lendo algo ou então falar com alguém ao celular. Assim como pessoas que se submetem a uma fila, se esta é regra e seja onde for, sou daquelas que buscam algo com que se entreter de forma a aproveitar o tempo.
Porém,
diferente dos demais mortais, nem sempre posso me dar a essa tática, sob o
risco de perder o "trem", isto é, perder a chamada da senha quando for minha vez, pois é necessário estar atenta à expressão labial da pessoa que for chamar oralmente pela senha.
Pessoas
surdas ou com deficiência auditiva não tem aquela flexibilidade dos ouvintes ao
processar a mensagem recebida, por mais espertas e inteligentes que sejam, e executá-las
em duas ou mais ações concomitantes. Deve-se priorizar a ação principal e
descartar a secundária. No caso, os olhos, além da função de enxergar, nas pessoas com surdez também eles desempenham a tarefa de ouvir, como
resultado da adaptação assimilada no decorrer do tempo, prova de que o corpo
humano é uma máquina magnífica.
Deste modo,
o processamento de ações deve ser feito por etapas, permitindo a noção da
ocorrência de um evento por vez, sua execução até o resultado final, para em seguida
executar a próxima ação e assim por diante.
Voltando àquela
cena, quando chegou minha vez de ser atendida, o funcionário surpreendeu-se com
meu sotaque característico e emendou:
- Que legal,
você fala. Uma surda que fala, né?
- É mesmo?
Perguntei. Vocês nunca viram uma surda que fala?
- Não, a
gente só vê "surdo que é mudo", ele respondeu.
Como se todo
surdo tivesse que ser mudo por natureza...
Habituada a estas e outras tantas reações das pessoas num primeiro contato que, por
curiosidade ou assombro em relação à minha voz de surda oralizada, arriscam perguntar
qual é a minha língua ou qual o país que nasci, se tenho a língua presa, etc. Para
elas, o que primeiro desperta a atenção é a voz e raramente a surdez, devido ao
sotaque típico, já que nasci ouvinte e fui acometida pela caxumba aos cinco
anos. Daí o que chamamos de surdez pós-lingual, que caracteriza as pessoas que
perdem a audição depois da aquisição da fala.
Reações
desse tipo tornam-se rotina e isto impede o anonimato, aparecendo sempre como
destaque nas conversas. Algumas vezes, dependendo do astral, chega a cansar
até. Por outro lado, vejo que na vida há momentos que são nossos unicamente,
feitos sob medida e ocasião de mudança e transformação. Então canalizo a exposição como um meio
de esclarecer o que as pessoas desconhecem e falar sobre a
inclusão, os termos corretos, as diferenças. Enfim, promover a diversidade.
É meu jeito
de ser.
Pela
Inclusão e pela Vida.
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