Segunda parte - Os ventos sopram
O Movimento Passe Livre
(MPL), que já vinha atuando há alguns anos, desde 2003 tinha uma pauta com
propostas contra o aumento abusivo das tarifas do transporte coletivo e, ainda,
pela transparência dos gastos, bem como a destinação dos valores efetuados por
parte das empresas de transporte. Isso mostra como a pauta foi além e se
alastrou nas manifestações pelo país inteiro, onde descaso e cultura
predominante na classe governamental, de não dar satisfação ao que é feito com
o erário nacional, levando assim à crise de representação da qual nos
encontramos.
São Paulo e Rio de Janeiro lançaram
as primeiras manifestações, contudo, outras capitais e cidades de pequeno e
médio porte foram aderindo, em cujas manifestações à participação da população foram
proporcionalmente maiores. Destarte as mobilizações ocorridas aqui, que
sensibilizaram e deu maior fôlego a outros segmentos da sociedade, ocorreu em
virtude da truculência com que a polícia militar investiu sobre os
manifestantes desarmados. Era o estopim.
A duras penas a mídia,
fortemente polarizada e parcial, mudou o seu discurso de “pró-propriedade
privada”, neoliberal e anticongestionamento – com todas as ironias que a
história mostrou - para a justa visão do direito à livre expressão e
manifestação. Mudança essa a posteriori das cenas televisionadas, filmadas e
relatadas pelas redes sociais, do horror com que a polícia tem sido ao tratar
civis desarmados.
Levantar uma bandeira
“apartidária” ou a do Brasil se mostra um gesto preocupante, no entanto é
latente a crise de representação partidária ou mesmo de centrais sindicais e de
grupos estudantis institucionalizados como no passado funcionou tão bem. O
próprio MPL se define como um movimento horizontal e sem lideranças refletindo
a tentativa de expressar uma contracultura, sendo ele próprio a liderança da passeata.
Mas é fundamental que se tenha a presença de partidos, a ditadura e os
fascismos europeus eram avessos a partidos. E aqui vale lembrar que eram poucos
os partidos, e de esquerda, que estavam presentes no ato em apoio.
Estes questionamentos, além
da reivindicação de políticas públicas de qualidade, tem demonstrado que a
população está descrente, pelo que se vê nos cartazes. A indagação ao sistema
atual vigente deve ser considerada se, além da apresentação de propostas e
alternativas, houver também um empenho intrínseco pela luta, no colocar a mão
na massa e trabalhar pela transformação concreta dos destinos do país.
Palavras de ordem e protestos
tem um peso significativo para acenar com mudanças, mas só acontecem na base do
agir, do fazer acontecer. Ora, toda mudança implica em ruptura - ato de romper,
rebentar – que é um processo doloroso. Sem isto, não há como vislumbrar a
transformação do paradigma, quando o descontentamento e a indignação dão lugar às
ações concretas que visam transformação da realidade num outro modelo, não
desigual.
É sábia aquela frase dita
por Jesus Cristo: “Ninguém põe remendo de pano novo em roupa velha” - cf. Mt
9,16 - destarte, transformar o contexto da insatisfação representativa implica
mudar a cultura de governar o país, como também a cultura popular na hora de
expressar o voto pelo sufrágio universal. Aqui, o povo não está querendo o
poder, mas a transformação do paradigma vigente.
Os ventos que tem soprado
nestes últimos dias, já apontam algumas medidas sendo tomadas, que demonstra o
poder e a força popular. Há, porém, que se cuidar para não cair no canto das
sereias, das estratégias rápidas e maquiadas, sem efeito duradouro, porque não
fundadas nas mudanças estruturais necessárias para o bem da nação.
Inclusão é vida.
(Este artigo foi escrito em
parceria com o sobrinho Lucas, graduando em História pela UNIFESP, no calor dos
acontecimentos que ocorrem pelo país, e cuja reflexão faz-nos revisitar a
história)
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