PRETENSÃO

Ampliar os horizontes da inclusão é a pretensão deste blog. E inclusão não apenas entendida como movimento de pessoas com deficiência, senão também abordar a ecologia, os movimentos de luta por direitos e cidadania, etc. Falar de inclusão, portanto, significa acolher o meio e todas as pessoas. Significa também respeitar e tolerar a singularidade, fazendo da compreensão uma forma de convivência pacífica e plural. Na inclusão ninguém pode ficar de fora!

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

RENATA


RENATA


Sexta-feira. Na preocupação de "ganhar o dia" entre filas, contas, trânsito, obra da casa e compras... Peguei o ônibus. Sorte estava vazio. Sentei-me próximo ao motorista e então resolvi relaxar, ordenando as ideias que aquela agitação toda ainda não permitira.
Próxima parada e num relance, vejo o rosto cansado do motorista que, voltado para a porta, responde a uma saudação de boa tarde!
Imediatamente olho para a entrada e noto uma garota a subir os degraus seguida por sua mãe. Rosto jovial de quem aparenta entre 18 ou 20 anos, alegre, bonita e educada. Observa atenta a resposta do motorista à sua saudação e vai logo sentar-se ao meu lado.
De imediato, corei de vergonha tão logo notei que, assim que adentrei no ônibus, nem sequer fui capaz de cumprimentar o motorista, tão absorta estava nas minhas preocupações, na pressa.
- Olá, tudo bem? Ela dirigiu-me a palavra, logo sentando-se ao lado e fixando seus olhos nos meus!
- Oi, tudo bem sim. E você? Perguntei.
- Hã ? Não entendi, retrucou.
- Eu disse que tá tudo bem comigo, e você?
- Ah, tá bom! Que aconteceu com sua voz? Perguntou.
Antes que respondesse, ela aproximou-se quase a encostar seu rosto no meu. Percebi então que, além da leve deficiência era estrábica, talvez com baixa acuidade visual. Daí quisesse captar as linhas da expressão facial, como é peculiar às pessoas de baixa visão.
-Eu não ouço! É por isso que eu falo assim. Será que você me entendeu agora?
Ela sorriu, envolveu seu braço por entre o meu e segurou minha mão com força e delicadeza ao mesmo tempo:
- É mesmo então? Qual é o seu nome? Onde você mora?
Seguiram-se outras perguntas. É normal! Temos que respondê-las sempre, de igual para igual, sem infantilizá-los.

Confesso que todas as vezes em que abro um diálogo com pessoas que tem deficiência intelectual, a conversa rola solta, íntima e natural, como se já nos conhecêssemos há muito tempo. O pouco que nos falamos ali naquele instante tirou-me do torpor a que estava submersa em meus problemas e arrebatou para a felicidade estampada no rosto daquela garota, que traduzia simplicidade e singeleza.
Daquela conversa, soube que se chama Renata e é muito feliz com a vida!
Como é energizante um acontecimento dessa natureza, que nos arranca da rotina, das preocupações e neuroses, fazendo-nos "acordar" para coisas simples e pequenas da vida, realçando situações de felicidade que muitas vezes nos passam despercebidas!

Ganhei o dia!
(Este artigo foi escrito em 2011, após um contato tão produtivo com a garota do texto. Contatos dessa natureza vem crescendo quase que rotineiramente, indicando maior abertura das famílias  ao envolver seus filhos numa participação mais ativa da vida cotidiana, frutos da inclusão).
Inclusão é vida.

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